terça-feira, 9 de junho de 2009

a título do coração,

ama-me, então, como eu sou
conheça-me,
para amar-me, assim, como sou

deixa-me conhecer-te
para amar-te como és.

deixa-me conhecer-me,
para amar-me a mim e poder amar a ti
deixe-se conhecer
e ame a si, pois, para amar a mim.

todos os amares são válidos
e perdidos em si, são só amores.

e o que haveria de ser, senão?

segunda-feira, 18 de maio de 2009

[de um amanhecer do ser que é]

o dia clareou num relâmpago. o sol já raiado entre os prédios, a claridade participando do movimento das cortinas e coisas do quarto. ver, perceber. deirtar-se nos pensamentos sutis do amanhecer, numa apressada calma de existir. sabendo-se ali deitado, observou-o levantar para enxaguar o sono do rosto. ainda naquele mar de roupas e lençóis espalhados, ele sentia os sonhos deles pairando na atmosfera das partículas que flutuavam pelos feixes que atravessavam as cortinas.
foi de repente que havia acordado. não sentido o braço recostado, sentia falta do leve repousar do sono em seu peito. mas estava ali, bem a sua frente: a suave beleza forte. belo porque existia, tão somente essa era a sua própria beleza, ali a se vestir...
arrumou-se e partiu, visto que o plano era sair antes do primeiro raio, e já havia vários espalhados pelo quarto, pela casa calma. bem de manhã; não havia som ligado, nem barulho na vizinhança. era manhã de segunda-feira.
ali, naquele quarto. naquela rua cortada de sombras, pois o sol ainda não havia se levantado com todo seu vigor. era uma fresca manhãzinha de segunda-feira e dava para tomar banho de sol da janela, aquecendo os sonhos que recém despertaram. despediram-se um pouco mais rápido que de costume e não puderam sorrir tanto no corredor, enquanto o elevador não chegava, pois haviam vizinhos a entrar e sair de seus apartamentos. mas riram-se, despediram-se, piscaram. sabiam-se assim, nos olhares quando não queria falar muito; nas longas conversas, quando era de palavras que tinham sede... até as bocas ficarem secas. como era a própria sede de matar a sede que tinham. souberam e seguiram. ele foi até a janela esquentar-se um pouco mais com a manhã. passeando o olhar pela cidade que desperta estava, avistando-o descer a rua, azul e verde, sorriu para si de satisfação e plena felicidade.
pois tinha o direito de permanecer assim, naquele estado das partículas ao sol, naquele lugar onde os sonhos pairavam - e por que não habitavam? - diante de si e dele, que descia a rua na força de ser o que era. passando pelo fio que cortava a rua, onde um beija-flor pousado cantara numa certa madrugada deles, seguiu pela outra rua, até desaparecer das vistas para existir nele.
decidiu por um café forte e enquanto o adoçava, se deu conta do quão presente é ser e deixar existir tudo aquilo em que se acredita. e que realmente saber se o outro é saber ser a si próprio primeiro. amou-se mais. amou-o mais.
nascia ali, naquela manhã ensolarada e aquecida. pássaros voando, raios cortando o céu, os véus do pensamento. o peito aquecido pelos sonhos e pela bebida amarga, pois havia desistido do açúcar. sabia que o amargo café seria o equilíbrio para o doce que a vida lhe dava.
nascia ali, sim, nascia da beleza de morrer e renascer nessas manhãs incertas de tamanhas decobertas... nasceu no peito, na explosão de um átomo contaminado de letras e músicas. nesse dia mais branco, no transbordar das taças.

sexta-feira, 13 de março de 2009

[dejá-vu de um peixe: re-ciclo]

a Marcos Henrique

momento de renascer se faz chegado,
já se foi, e mais ainda: é;
a revolução chega sem deixar recado!
e do brado saído do peito do anjos,
celebrou-se a dimensão que atravessas.

pobre poesia mal delineada,
pobre autor de loucas palavras.
mas que agraciado sejas tu, neste dia,
mestre dos sonhos e inquietações:

que tuas doces loucuras atendam aos corações atentos,
sedentos de arte,
que teu senso de humanidade alcance os vastos campos
das mais perdidas e suspeitas mentes,

e sejas tu o que tu és:
assim, insano de poesia,
embriagado de amor e arte,
criador de bons vinhos, de boas prensas...

e que o vinho se derrame e banhe e inunde teu corpo,
tua alma, que se derrame pelo solo sagrado
embebedando a mãe-Terra:
renascerás, sempre, então, em tantos novos frutos!


segunda-feira, 2 de março de 2009

... uma carta;

Estava há uns dias querendo te esrever.
Eis-me aqui, hoje, nessa madrugada, escutando Pearl Jam e outros rocks, saudando a passagem do carnaval, e escrevendo-te essas palavras...
Como foi a tua volta, a viagem e tudo mais?
Por aqui, as coisas andam bem, naquele jeitinho de fim de carnaval, até hoje... Um certo limbo, onde tudo acontece devagar e preguiçosamente.
Eu ando um pouco torto, assim, um misto de saudades e cortejo de volta a realidade. Uma certa vontade de voltar alguns dias e, ao mesmo tempo, deixar o tempo seguir sutil, revelando o que está no caminho adiante.
Amanhã começam parte das minhas aulas, a noite. Ainda terei uma semana de férias pela parte da tarde, que tentarei aproveitar ao máximo para faxinar o quarto, comprar uns cadernos e materiais necessários, terminar umas tarefas inacabadas, umas fotos, e quem sabe uma praia ainda.
Algumas coisas parecem estar começando a caminhar bem para o ano, outras parecem se decompor em função do inferno astral que passo por mais umas duas semanas. Não que eu o ache ruím ou inútil, mas é que tem certas coisas que caminham diferentemente do normal nessa fase, sabe...
Enfim, são apenas uns devaneios meus... um bom motivo para te escrever também, eu acho.Para dizer também que foi engraçado e singular ter conhecido você. Curtir rock'n'roll em pleno carnaval e ver amanhecer lindo e diferente, sobre o chão calcado da praça da Lapa.
Não duvido de nenhuma conspiração astral ou seja lá o que for... Não duvido da sorte também. E me sinto bem feliz, assim.

Espero que tenha feito uma boa viagem de volta, que esteja tudo calmo e interessante por aí. E espero também que cheguem logo notícias suas.
Não se esqueça do convite que estará sempre de pé. E qualquer hora, quem sabe logo?, eu apareço por aí numa tarde de outono ou inverno...
O Destino brincalhão anda sempre perdido por aí, ou por aqui, não é?
Cuide-se...

Um beijo em teu coração.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

infer-no astral

caminhava pelo corredor seguindo a faixa de luz vinda do quarto. atravessava a luz pela porta entreaberta, o torpor e a enxurrada de lembranças lhe transpassava o peito feito espada afiada. um passo após o outro, bem devagar, o corpo exausto, suado, tenso, as mãos trêmulas, o peito acelerado, o choro, o pesadelo. levantara da cama antes mesmo de acordar, tamanho impulso causado em seu corpo, tantas imagens e turbulência que não conseguiu respirar mais o sono morto, apagado em que estava.
havia tristeza e melancolia já desabotoando o corpo; os devaneios destemidos da alma carregavam todas as bagagens e malas para as mais variadas estações e paisagens.
perdeu-se alí, no meio do corredor, alguns passos mais adiante... uma ausência invadiu-lhe os pulmões a tal ponto de não poder respirar. inspirou fundo e soltou os braços ao longo do corpo, feito soldado flechado em guerra. num grito mudo, caiu de joelhos alí, perto da porta da sala, a luz do abajour do quarto iluminando suas costas, a luz da rua iluminando o cenário. o sofá com as almofadas bagunçadas deixava revelar qualquer paixão perdida entre papos e cigarros, visto que o cinzeiro estava cheio no canto da mesa de centro. alguns discos espalhados ao lado do aparelho de som. e ele mais adiante, esvaído em naquela onda toda que se misturou com a vigília noturna no campo dos sonhos. e tinha ainda o efeito do álcool; todas aquelas taças e garrafas e brindes, serviram pra que, senão pra uma dor de cabeça que mal lhe permitia soluçar, agora, caído naquele corredor mal iluminado, cheio de versos e canções na cabeça. tão perdido estava que não conseguia fazer as contas de quantos dias se passaram, de quantos ainda restavam.
temia, vez ou outra, sair durante o dia, e vez ou outra sair pela noite.
e não sabia também que hora da madrugada ou da noite seria. tateou a parede sem conseguir enxergar nitidamente, apoiou-se para levantar em direção a cozinha, ao calendário.
já se passava um terço da longa jornada de morte e renascimento. não encarava esse espaço de tempo como algo ruim e desfavorável, pelo contrário, pensava ser esse o tempo de maior aprendizado a cada renovação. 'é cíclico', pensou enquanto ajeitava um certo sorriso torto, já quase amanhecia, e não havia nenhum outro compromisso pela manhã a não ser o dele com ele mesmo.
foi até a sala, organizou as almofadas e limpou o cinzero e taças espalhadas, guardou o bilhete de despedida encontrado em cima do travesseiro amarrotado. chorou até estar inteiramente derperto e desgastado. tomou um comprimido contra a dor e desligou o abajour para perceber melhor o sol aquecendo o horizonte ao fundo dos prédios. acendeu um cigarro, debruçou-se na janela, olhou longe, observou com detalhes e desenhou em si cada imagem que conseguisse compreender ou não. sabia que entres seus dedos estariam alguns dos sonhos e tesouros que pensava ter deixado escorrer. mediu os palmos e percebeu que o mundo é enorme quando se sofre, mas que também pode ser do nosso tamanho, se embriagarmos os sonhos até fazerem reais.
coçou o pescoço, rindo, achando tudo isso muito piegas, mas achou mesmo, e gargalhou, tendo a certeza que era ótimo, e precisava ser piegas para ser realmente favorável, às vezes.
jogou-se tonto no colchão, sob o efeito de cigarros, álcool e divagaçõe, relaxou e foi participar em fase, por hora, do eterno ciclo coletivo de nascer e morrer. e renascer novo, de novo.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

chegada

mareja os olhos o cair da tarde.
sereno e calmo, os pensamentos vão passear por sobre a areia. ele, sem contar o tempo; sentado na beira, onde quase chegam as ondas, desenha os pés na areia e arrasta a ponta de um dedo, esboçando um soletrar de idéias. por vezes a perder o foco, olhava o horizonte que só era percebido onde a lua já começava a se refletir no mar.
havia perdido algo que não tinha guardado nos bolsos. algo que pesava por sobre a leveza de estar assim, meio torto. um pouco desajeito. desprendido, pensava ele.
até então, só o cair da tarde e a noite a se deitar...
foi quando uma onda mais forte veio molhar seus pés, e refletir também os seus sentidos. tirou algum pedaço de papel do bolso, admirou-o até lançá-lo ao mar. sacudiu, então, as pernas e a areia do tempo, corpo ao vento; aprontou-se em partida.
via-se agora a lua dominar todo o céu, com seu manto notívago de estrelas, refletindo nele a anunciação do que haveria de aportar no cais.